sábado, setembro 17, 2011

One world (?) I




Sempre achei que o mundo era perfeito, desde que eu o fosse.

Estava a sair da escola. Era uma quinta-feira normal, apenas mais uma quinta-feira no meio de tantas outras quintas-feiras. Estava cansada, semi-morta, desejosa de chegar a casa, poisar a pasta e deitar-me na primeira cama que encontrasse.
Deparei-me então com um grupo de rapazes jovens, provavelmente com mais dois ou três anos que eu. Estavam reunidos em círculo, e olhavam todos para o centro do mesmo. De onde eu estava não se percebia bem o que se passava, mas pareceu-me ouvir alguém chorar. Foi então que me comecei a dirigir ao sítio onde estes jovens se encontravam. A cada passo que dava, a minha vista chegava mais longe, até que finalmente consegui reconhecer a "atração principal" que se encontrava no meio deles: um rapaz.
Não era um rapaz qualquer: Usava calças justas, botas, maquilhagem e cabelo com madeixas de diversas cores. Andava no curso de artes e era homossexual assumido. Todos o sabiam, todos mesmo. Aqueles rapazes estavam a maltratá-lo por ele ser gay, e estavam a gostar. Um deles deu conta da minha presença, e, olhando-me com um olhar ameaçador, gritou bem alto:
-Vai para casa antes que sobre para ti!
Fiquei receosa. Comecei a andar em direção a casa, tentando afastar-me o máximo possível da zona onde eles se encontravam. Acelarei o passo para que não me apanhassem.


Pensei que já estava segura, e respirei fundo. Comecei a andar normalmente outra vez, até que reparei num vulto preto à berma da estrada. Foquei o olhar e vi: era um gato. Um gato aparentemente morto, pois via-se o sangue vermelho vivo a escorrer. Alguém o devia ter atropelado, e deixaram-no, moribundo, meio-morto, meio-vivo. As pessoas passavam por ele e riam-se, ou faziam caras enojadas, como se olhassem para um qualquer pedaço de lixo. Houve até uma criança que tentou pegar nele para o curar, mas a sua mãe proibiu-a e disse:
-Não mexas, que nojo.
"Meu Deus"- pensei eu. "Um ser vivo moribundo, a precisar de ajuda, e as pessoas tratam-no como lixo."^
Liguei para a veterinária, que rapidamente se dirigiu ao local. Só retomei o meu caminho para casa quando ela me disse "Podes ir, nós vamos tomar conta dele e vamos-te avisando."


Mal cheguei a casa, fui cumprimentar minha mãe. Ela estava sentada no cadeirão, vendo as notícias. Quando entrei na sala, olhei para a TV e vi uma noticia em destaque: "Ataque suicida-bombista no Iraque causa 90 mortos."
Fiquei perplexa ao olhar para as imagens dos meninos esqueléticos, moribundos tal como o gato que tinha salvo. E a eles, as pessoas também passavam ao lado e fingiam que não estavam lá. Como é que é possível ser-se tão cruel?


Subi as escadas a correr, tranquei a porta do meu quarto e aí fiquei.
O sol estava-se a pôr naquele exacto momento.
O momento mais mágico de um dia. De certeza que ninguém estará a cometer essas crueldades horríveis a esta hora.
Quando dei por mim, vi dois homens embriagados à luta. Gritavam nomes feios, porcos e ofensivos um ao outro. Um deles estava com a sua filha, que tinha menos de 4 anos. Ela chorava e pedia ao papá para ele a levar para ao pé da mamãe, mas este estava mais preocupado com uma briga estúpida.
Senti-me doente naquele momento. Envergonhada de mim própria. Como podia eu pertencer a uma espécie tão cruel?
Baixei as persianas, fechei a janela e deitei-me na cama. Não quis acordar mais...


continua*

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